"Minha música está tocando nas rádios. Isso se chama jabá"
Há 20 anos ele briga com as gravadoras, denuncia o ‘jabá’ nas rádios e critica a postura de seus colegas. Ao beirar os 50, Lobão volta a ser personagem do circo que tentou destruir e grita: ‘isso é um golpe de mestre’
Lobão está sentado na sala vip de sua nova gravadora, a Sony BMG. Feliz por lançar um CD e um DVD ‘Acústico MTV’, e por agora ouvir suas músicas tocando nas rádios como nunca, Lobão tem muito a explicar. Sua fama nas últimas duas décadas foi conquistada graças aos ataques que fez à mesma indústria com a qual, agora, troca carícias.
Claro que você esperava levar pedrada ao decidir lançar um disco por uma grande gravadora não é mesmo..??. (jornal da tarde)
Lobão: Assim como esperava levar latadas no ‘Rock in Rio’. Eu queria provocar essa situação. Fiz isso por vários motivos. Estamos vivendo um cenário de esquerda tão chulo. Eu ajudei a eleger esse presidente que esta aí, ajudei pensando que o PT iria interagir em minha luta anti-jabá , mas quando vi o PT praticando mensalão me senti desmoralizado e comecei a ver que a esquerda festiva caiu no assistencialismo, na bagunça.
A história não foi sempre assim? (jornal da tarde)
Lobão: Eu acho lamentável a história da música brasileira ser toda de esquerda. Grandes compositores brasileiros que aparentemente fazem música de protesto, na verdade, fazem música de vítima. Quando você ouve ‘caminhando e cantando e seguindo a canção’ (de Geraldo Vandré), isso foi feito por um cara que está com pena de si próprio. Quando você ouve ‘O que será, que será’ (de Chico Buarque) o cara está com pena de si próprio. Eu não dou o menor valor para isso. Isso é coisa de zebra, de antílope. Eu sou lobão, sou predador, eu quero potência. Não sinto potência na nossa música, nossa música é passiva, privilegia a preguiça, elogia a preguiça, se embevece com nossa pobreza, com o nosso primitivismo.
Você falou dos grandes compositores brasileiros...(jornal da tarde)
Lobão: O João Gilberto não tem culpa de ser o que ele é, mas eu adoro bater no João Gilberto não pelo que ele é, mas pelo que cultuam dele. Quando um novo baiano quer ser velho, vira João Gilberto. O grupo Novos Baianos era maravilhoso. A partir do momento em que seus integrantes se encontraram com João Gilberto, morreram todos.
Suas opiniões são contundentes, os jornalistas o procuram muito por isso e tal. Mas elas não ficaram mais famosas do que suas músicas ? (jornal da tarde)
Lobão: Quando eu saí do mercado, era um doidão maconheiro. Pô, recebi 132 processos, onde eu ia me acusavam de fazer apologia às drogas. Eu andava com um advogado que tinha um habeas-corpus do meu lado. Me chamaram muito de falastrão, mas as pessoas não podem se esquecer de que o falastrão foi o que me fez sobreviver. Se eu não tivesse falado, ninguém iria ouvir minha música. Eu consegui ter prestígio e visibilidade nessa hora. Estava brigando com a Sony porque ela estava sentada em cima dos meus masters. Passei 20 anos sem ter acesso a eles. Só tenho agora graças à nova gestão.
E essa nova gestão fez você passar uma borracha na história dos processos que movia contra a Sony ? (jornal da tarde)
Lobão: É lógico que eu passei uma borracha. Mesmo porque, agora vamos voltar àquela coisa do ‘só falar’. O ‘só falar’ me deu ao mesmo tempo uma projeção, mas na época os diretores das gravadoras diziam ‘ah, o Lobão não sabe fazer um outro Me Chama, está falando porque está decadente.’ Eu agora estou tocando em primeiro lugar na rádio com a mesma música que eles (as rádios) estavam proibindo. Isso é um golpe de mestre.
Ou um golpe de jabá. (jornal da tarde)
Lobão: Mas é óbvio que é jabá, e eu quero mostrar que é. Quero mostrar que eu sofri vinte anos sem tocar no rádio, com as pessoas dizendo que eu era um decadente, um recalcado, um invejoso e que eu não sabia mais fazer música. Agora, por que está tocando em primeiro lugar na rádio? Agora posso explicar para as pessoas o que é jabá. Jabá é isso, é o que você está vendo, eu estou tocando na rádio. Não tenho problema em falar nisso. Nós somos o país do jabá. Um país em que neguinho paga para passar de ano, paga para aniquilar uma multa, paga para ter carteira de motorista, nada é meritório. O governo, em vez de privilegiar o cara que empreende, vai dar para o pobre sem cobrar nada dele. Há uma classe de pessoas que pari filhos só para obter uma bolsa família. O Brasil é o País do não mérito, onde tudo pode acontecer se você pagar. Você não merece ter uma carteira, não merece estar tocando no rádio, não merece nada, tudo é ‘jabaculezado’. A cultura que estou atacando é a mãe de tudo isso.
Então tudo é um golpe..? (jornal da tarde)
Lobão: É lógico que eu não sou nenhum Paulo Ricardo, você está vendo que não estou me arrependendo de porra nenhuma. Pelo amor de Deus, estou inaugurando uma nova era. Os músicos sempre encaram o acústico uma coisa sem méritos, então fazem malfeito e acreditam que, porque vai ter o jabá, vão colocar na rádio e vai tocar.
O que viria ser essa "nova era" ? (jornal da tarde)
Lobão: Já batemos o suficiente nas gravadoras, e agora entrou uma nova geração de diretores aí. Os Mutantes foram contratados por uma gravadora, é hora de fazer parceria. A Internet cresceu, as gravadoras encolheram, as rádios, em vez de cobrar jabás, estão agora optando por ringtones (músicas para celulares).
Como assim ? (jornal da tarde)
Lobão: Em vez de jabá, elas estão querendo vender as músicas para virarem ringtone. Elas colocam a música na programação, a pessoa gosta e acaba comprando o ringtone. Isso democratiza muito a situação, é muito mais justo do que o jabá.
Não parece ser algo bom demais para as rádios, não é também exploração da obra do artista ? (jornal da tarde)
Lobão: Mas cara, a gente tem que tomar cuidado, não podemos ficar demonizando, tem uma hora que eu prefiro lidar com um capitalista tubarão do que com um culpado católico que quer botar bomba em rádio. E olha que rádio comunitária cobra jabá como as rádios grandes. Eu sei disso porque estive lá. Então está todo mundo dominado. Demonizar as rádios é fácil. As pessoas têm que entender que há ciclos.
Seus raciocínios seguem uma lógica, ok. Agora, continua existindo um outro lado aí. Seu público, os músicos independentes que o seguem, jornalistas que embarcavam na teoria do Universo Paralelo, para essas pessoas não fica estranho sua postura de agora? (jornal da tarde)
Lobão: Eu sei o que você vai falar. O que vai acontecer é que vocês vão saber que eu estou com a razão, cara. Eu raciocino cinco jogadas de xadrez antes. Quando eu fui fazer disco independente, neguinho me malhou. Quando fui fazer a revista independente, a mesma coisa. Quando saí da banda Blitz, nos anos 80, os caras diziam ‘você é maluco, vai perder a sua vida, poderia comprar seu apartamento com o que iria ganhar lá’. Eu fui contra e sempre me dei bem, isso porque eu sei o que estou fazendo. Eu sei que tenho um repertório que poucos artistas têm. Cara, eu tenho no mínimo 30 hits nacionais, não há ninguém da minha geração que tenha isso.
E deles, 80% são hits românticos. Você, no fundo Lobão, é um cantor romântico. (jornal da tarde)
Lobão: Eu faço canções, e a maioria delas é love songs, canções de amor. Os jornalistas fazem um diferença entre balada e rock, mas para mim a balada é a alma do rock. Eu cresci ouvindo Yesterday, Hey Jude, Wild Horse, Angie, Starway to Haven, Hotel California, todo mundo que se perpetuou fez uma balada na vida. Isso está dentro de mim. Me desculpe, mas se pegar uma balada minha e uma do Lulu Santos, vai ver uma diferença brutal.
Músicas suas em outras vozes ficam mais, digamos, doces...(jornal da tarde)
Lobão: É claro que quando um cara assassina, ele assassina. Quando o João Gilberto canta ele assassina. Ele brocheia a música, despotencializa. Se eu uso um acorde maior, é porque quero um acorde maior. Eu estudei com Guerra Peixe, sei harmonia, mas queria um acorde maior ali. Cara, eu tenho muita facilidade em tocar as coisas, eu sei tocar bem, sou um baita músico, toco milhares de instrumentos bem, toco muito baixo, guitarra, e isso faz diferença na hora de fazer uma música. Cara, eu tenho um texto forte, sei que escrevo bem. Não conheço alguém que escreva tão bem quando eu, desculpa te falar isso.
Matéria extráida do site do jornal da tarde em 16 de abril de 2007.
Alvaro Augusto - Produtor Cultural e Advogado.
Matéria postada em 16 de abril de 2007.
1 Comments:
Belo post, Augusto.
Lobão é um cara sem igual, mas é tão arrogante quanto é competente.
E o pior é que eu acredito mesmo que ele "sabe o que tá fazendo". Não em inocência, mas deve ter pintado o convite da Mtv/Sony e ... bom, dinheiro, né.
Sei que fizeram um escândalo sem fim lá na comunidade dele :^p
10:15 PM
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